O Choque Cultural
Por MartaCastro em
Choque Cultural
O conceito de choque cultural foi descrito pela primeira vez em 1954 por Kalervo Oberg, antropólogo e economista. Este autor descreveu o choque cultural como uma série de reações emocionais resultantes da perda dos sinais e símbolos de interação social. É a consequência do esforço que temos de fazer para lidarmos com novas situações.
Para Oberg, o Choque cultural é consequência do esforço resultante do contato com uma nova cultura, incluí o sentimento de desordem, confusão e impotência resultante da perda das informações culturais e regras sociais previamente estabelecidas. Não depende se somos “viajados” ou “open-minded” ou se temos boa vontade. Apesar de não poder ser totalmente eliminado, pode ser atenuado.
De acordo com este autor, nós não nascemos com uma cultura, apenas com a capacidade de a perceber e usar. Assim, pelo processo de socialização aprendemos a cultura e esta passa a fazer parte da nossa maneira de viver, torna-se familiar, automático e trás segura nas interações sociais.
Oberg descreve o processo de adaptação a um novo ambiente cultural como uma curva em U com os seguintes estágios:
1. A Fase de Lua de Mel
Neste primeiro estágio, as diferenças entre a antiga e a nova cultura são vistas de forma positiva, romantizadas ou até mesmo idealizadas. O novo país parece maravilhosamente diferente, tudo é interessante. É a aventura de se estar um país distinto, de nos perdermos nas ruas, de encontrarmos lugares incríveis e diferentes do nosso país.
Sintomas de ansiedade e stress tendem a ser interpretadas positivamente. Esta fase pode durar alguns dias ou algumas semanas, ou até meses dependendo das circunstâncias.
2. Frustração/Choque cultural
Quando a fase de Lua de Mel termina e as barreiras culturais aparecem, a dificuldade de comunicação, o cansaço e frustração provenientes das dificuldades de comunicação, de resolver coisas simples que se tornam incrivelmente complicadas, gera frustração, irritação, tristeza e saudades de casa e do que é conhecido.
Quando as diferenças culturais se evidenciam a pessoa sente-se desorientada por não ter ainda o novo referencial cultural. A maneira de lidar com estas dificuldades e desafios é subjetiva. Algumas pessoas podem adaptar-se facilmente, outras sofrem consideravelmente e podem, inclusivamente desenvolver sintomas mais graves e problemas psicológicos ou psicossomáticos.
Esta fase pode começar como uma grande crise ou em uma série de pequenos problemas que vão se acumulando. Por exemplo, pequenas dificuldades que se tornam problemas gigantescos e as diferenças culturais tornam-se exasperantes. Por exemplo, problemas no trabalho, na escola, com a língua, com os transportes, levam ao sentimento gradual de desilusão, impaciência e frustração. O indivíduo pode sentir que as pessoas são indiferentes às suas dificuldades e passa a não gostar das pessoas. É comum o sentimento de confusão e rejeição por parte dos outros e isso pode levar ao isolamento, raiva, hostilidade e até mesmo à depressão.
Nesta fase, o país de origem torna-se extremamente importante ou até glorificado.
Adicionalmente, surgem críticas sobre essa sociedade, a cultura e as pessoas. Os estereótipos existentes são criados e reforçados. Inconscientemente, o indivíduo procura elementos no ambiente que reforçam os estereótipos. Se esta situação se mantiver, a pessoa não vai conseguir compreender de forma holística o ambiente onde está inserido e poderá até decidir retornar ao seu país.
Esta é a grande diferença de quem viaja e de quem se estabelece e vive nesse país, porque acaba por descobrir mais profundamente a cultura e as dificuldades de viver e lidar com essas diferenças, comparativamente a quem simplesmente viaja e regressa ou parte para outro país.
3. Fase de Adaptação
Quando começamos a ter uma rotina, a aprender a lidar com as diferenças, quando nos sentimos mais familiarizados com o ambiente e aprendemos como resolver os problemas do dia a dia e outros assuntos burocráticos, ficamos mais à vontade com a cultura e as pessoas. Aprendemos os significados da nova cultura e desenvolvemos estratégias que permitem lidar melhor com as situações cotidianas. Provavelmente ainda não nos sentirmos totalmente confortáveis ou em casa mas é um passo importante para nos sentirmos mais calmos, integrados e menos zangados e frustrados.
4. Fase de Integração
Nesta fase, aceitamos as diferenças e sabemos viver com elas mesmo quando não as percebemos muito bem. As pessoa acabam por absorver alguns dos significados da nova cultura, compreende-os melhor e sente‐se mais confortável. Novamente, o período temporal para chegar a esta fase é muito subjetivo e cada pessoa vivência de forma particular.
A fase de integração é o consolidar da aprendizagem de como nos ajustarmos efetivamente ao novo ambiente cultural. A resolução do choque cultural reside em aprender como realizar uma adaptação aceitável à nova cultura. Para uma solução efetiva é necessário que haja ajustamento e adaptação: capacidade de resolver problemas para lidar com a cultura e começar a aceitar de forma positiva. A cultura começa a fazer sentido e as reações negativas passam a ser menores. Este ajuste é lento e requer vários ciclos de crise e adaptação.
A assimilação cultural acontece quando se consegue desenvolver uma adaptação estável, a capacidade de resolver com sucesso problemas na nova cultura (entre 6 a 12 meses). Quando as pessoas já sabem o que esperar nas diversas situações do dia-a-dia e já têm a sua rotina. A total assimilação de uma nova cultura é difícil, ou até mesmo impossível. Contudo, é normal que haja mudanças nas pessoas com o desenvolvimento de uma identidade bi-cultural. A assimilação cultural não implica abandonar ou esquecer a nossa cultura nem perder a nossa identidade cultural, é sim o desenvolvimento pessoal e de recursos para criar respostas culturais e pessoais que se ajustem ao novo ambiente.
Sugestões para facilitar a adaptação:
– Perceber a cultura de onde vem e onde está (existem testes culturais que ajudam neste processo)
– Aprender sobre a cultura local (livros, workshops culturais são muito benéficos)
– Dialogar e procurar apoio emocional (blogs de expatriados, organizações, etc)
– Cultivar a cultura de origem
– Refletir sobre o processo de mudança e do choque cultural
– Pensar no seu propósito de imigração ou expatriação a longo prazo
– Procurar ajuda profissional (psicólogo, terapeuta, coach intercultural ou de transição)
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